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O Carnaval, as máscaras e o cristianismo

 




1. O Carnaval, as máscaras e o cristianismo

Desde as festas a Dionísio na Grécia até ao colossal evento na Marquês de Sapucaí, o carnaval não deixou muitas dúvidas sobre ser ele uma das festas mais populares da história. É possível encontrá-lo praticamente no mundo todo, vestindo trajes culturais relacionados ao lugar onde é visto, ele vai de Salvador a Bruxelas, de New Orleans até Tóquio.

Mesmo sendo flagrante a diferença entre o que acontecia nas festas em Roma até o bilionário evento no Rio de Janeiro, o carnaval apresenta um ponto comum: ele é a festa das máscaras. Sua origem na Antiguidade aponta um nascimento geminado com o teatro grego. O carnaval e as máscaras andam juntos onde quer que sejam encontrados. E não é somente a atividade artística de cobrir o rosto com peças cuidadosamente elaboradas e coloridas, o carnaval é a manifestação do não ser ou, no mínimo, da vontade de ser outro. É a festa da inversão. Nele, homens podem ser mulheres e mulheres podem ser homens, os ricos ficam pobres e os pobres são destaques em posições elevadas, o escondido é declarado e o ato de se mascarar está associado em desmascarar o outro.

Numa contagem regressiva da consciência de que a realidade virá nas cinzas da quarta-feira, o folião se prende ao se entregar, a carne assume o comando com foco no prazer, nesses dias de recriação de um mundo despecaminalizado o ser é livre para viver uma existência imaginada, outrora aprisionada, agora feliz.

A compreensão da Festa da Carne com suas influências medievais é mais do que uma curiosidade. O carnaval se prende a um calendário litúrgico, agrícola e astronômico. Ele está entre o Ano Novo e a Pascoa e esta, é determinante para a colocação da data do carnaval no seu lugar pois se via a necessidade de haver preparo para os dias de restrição que todo o contexto da Páscoa iria trazer, ou seja, “vamos nos alegrar porque a tristeza vem aí”.

Abaixo da superfície colorida do carnaval reside o antagonismo entre as coisas do espírito e as coisas da carne no imaginário popular, não como oposição entre o bem e o mal, mas como uma luta entre o bom e o ruim, isto é, a compreensão de que as coisas verdadeiramente prazerosas não são religiosas e o carnaval permite uma janela de alegria e prazer em uma parede de chatices.

Esse pensamento está presente no mundo contemporâneo. A humanidade compreendida pelos gregos e pelo medievo não é apenas dicotômica, mas suas partes são antagônicas. O resultado é uma espiritualidade encarcerada no porvir e uma religião que não pode ser vivida no corpo. A ideia céu é sempre enfadonha, a santidade é inútil beirando a alienação e o cristianismo é associado a tudo que cerceia a existência, detentor de um peso moral insuportável como uma masmorra cujo escape é a festa da carne.

2. A insatisfação, o cansaço e o descanso

O conceito bíblico de felicidade está no centro da questão. Na carta que o apóstolo Paulo escreveu aos Gálatas, discorrendo sobre os efeitos da ação do Espírito Santo na humanidade, ele diz que “O fruto do Espírito é amor”, logo em seguida mencionando a “alegria”, (Gálatas 5:22). Note a ênfase de Paulo ao confirmar a alegria no presente sem negar sua origem sobrenatural. Em 1 Coríntios 13:6 ele diz que a vida no amor de Deus traz regozijo com a verdade. As pessoas rendidas a verdade se alegram com ela, ao contrário de se aprisionarem numa santidade falsa e consequentemente escravizadora.

A Bíblia localiza a gênese do mal no universo e em cada pecador no ambiente de um coração insatisfeito. Lúcifer, não se rebelou contra o governo de Deus sem se desgostar de sua própria condição, da mesma forma o desejo de livrar-se de uma insatisfação artificializada pelo egoísmo é nominada na bíblia como cobiça e descrita como raiz de todos os males (Romanos 7:7, 8; Tiago 1:14, 15) Não à toa, a Escritura diz: “Regozijai-vos sempre” e “em tudo dai graças” (1 Tessalonicenses 5:16,18). A alegria e a satisfação nesses textos não são descritas como entorpecentes alienantes da difícil realidade humana e nem como prêmio a ser alcançado em um mundo perfeito futuro, mas como um estado do ser que encontrou a graça e o perdão em Jesus Cristo (Salmo 51:12).

Jesus se viu diante de uma sociedade fatigada por carregar as máscaras religiosas da recompensa moral. Não havia deleite nas pessoas que deviam se alegrar por pertencer a um povo santo e ter recebido revelações extraordinárias da parte de Deus, pelo contrário, a vida era um fardo cheio de regras e medos e a liderança espiritual estava muito mais próxima de uma sociedade de vigilância do que uma comunidade de amor.

“Vinde a mim”, disse Ele, “vós que estais cansados e sobrecarregados e eu voz aliviarei” (Mateus 11:28). Um convite pessoal a satisfação completa. O Salvador, ao contrário do que Seus ouvintes estavam acostumados, não indicou uma receita, Ele chamou a Si, convidou a um relacionamento e Se apresentou como cura ao cansaço e a sobrecarga. Jesus fez um convite e não uma proposta, Ele não reduziu sua solução a uma emergência ou a um alívio momentâneo, Ele propôs uma ruptura para um novo modelo de vida, uma vida no Espírito que se desdobra satisfação e contentamento em vez de cansaço.

É fundamentalmente importante notar que Ele não descarta a verdadeira espiritualidade. Cristo, antes de tudo, ataca o problema na sua raiz, ou seja, o jugo inadequado: “Tomai sobre voz o meu jugo”. O Salvador, não afirma a necessidade de uma farra irreverente como alívio de uma vida regrada e santa, ao contrário, Ele concede graça e santidade como descanso para a vida neste mundo caótico.

Há, de fato, uma mensagem dada pela grande festa popular: o retrato de um mundo exausto de si mesmo, sentindo o peso das máscaras que ele mesmo construiu e buscando beber solução na fonte de seu problema. Tiramos as máscaras e não suportamos por muito tempo a realidade que elas escondem, colocamos as máscaras e, da mesma forma não suportamos o peso de carregá-las por tanto tempo e diante de tanta gente. Jesus nos chama a uma experiência de satisfação completa, não substituindo nosso cansaço por uma outra versão danificada e fantasiosa de nós mesmos, mas por uma vida nEle, confiando na perfeição das Suas decisões e vivendo a alegria da Sua presença.

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